sexta-feira, 8 de junho de 2007

Renata - Claraflor

RENATA
Por: Claraflor
Junho 2007


Ingrata é a covardia que aqueles olhos bêbados
cometeram contra a ingenuidade de quem não esperava.
Foi meu ombro acolher a dor
que te amedrontava trazendo tantas hipoteses
do que aconteceria na mesa de cirurgia,
veio o teu beijo com gosto de podridão mental ...
não quero mais o teu sorriso;
não quero mais as tuas confidências;
não quero mais nada teu!
Estou ferida pelo beijo
que me empurrou sobre a porta do banheiro
e traiu nossa amizade...
Vejo meus olhos no espelho
com cor de ressaca moral...
Não sei odiar...
anda amo a ingratidão da tua alma louca
e fiel aos tantos segredos que trocamos
em noites de bebedeira nos bares da vida
não posso imaginar
os cacos da minha face
espalhados no chão
quando o abraço e o sorriso
que sempre correram na frente
pra chegar primeiro em você
correrem disfarçando o que não sei o que é
não sei quem sou
não sei o que sou agora
e sempre que o gosto dos lábios da minha melhor amiga
volta ao meu pensamento...

segunda-feira, 4 de junho de 2007

CINCO HORAS INDIGENTES - Ébano Silva



CINCO HORAS INDIGENTES
Ébano Silva
3Junho 2007
Saia de mais uma prova, quando no portão do colégio lembrou-se que havia esquecido o celular com o fiscal de sala, ainda indignado com a parte especifica que falava de tantas coisas que nunca havia ouvido: pocilga de seqüestro, desensibilização de aves, carcaças de aves e outras referentes à pecuária e à vigilância sanitária. Voltando p o carro não encontrou a chave, fez o caminho andando vagarosamente esperançoso de que pudesse acha-la: uma, duas, quarenta minutos e não conseguia acreditar que a chave havia sumido. Sentou-se em frete ao estacionamento onde o carro estava, várias ligações a cobrar para os conhecidos, colegas, amigos, parentes e ninguém atendia, o porteiro do edifício percebeu que algo estava errado e se aproximou: - Tá precisando de alguma coisa?
Desceu com o nome do chaveiro e o telefone anotado em um pedaço de saco de pão, aproximando-se do quiosque percebeu que estava fechado, o celular tocou: - Onde você está, tô te esperando aqui na parada a mais de vinte minutos?! Como se tudo não bastasse esqueceu-se que o irmão estava de carona e havia combinado de pegá-lo quando a prova terminasse.
A situação ficou tão crítica que foi obrigada a irmã: - Tudo bem, eu vou esperar o meu marido voltar da caminhada e peço p ele levar o chaveiro até aí! Depois de uma hora de espera, o mundo das cinco horas indigentes começou a mostrar-lhe o outro lado da vida. O estômago roncando quando um casal de namorados passou comendo cachorro quente e aquele cheiro maravilhoso, do que não comia há anos: salsichas( Seria tão bom ter ao menos uma salsicha crua para acalmar a fome!).
Anoiteceu e a irmã não retornava a ligação. A sede lhe fez pensar em economizar a água do planeta, tantas pessoas na rua e ninguém para dar-lhe um copo d’água; dali em diante, todas as vezes que alguém batesse em seu portão iria levantar-se mesmo que estivesse deitada vendo televissão depois do almoço de domingo. Pensou nas pessoas que moram na rua e a certeza chegou-lhe: - Meu Deus! Basta perder a chave do carro, não ter crédito no celular e apenas cartões de crédito na carteira, num final de tarde de Domingo para saber o que é ser um, desses miseráveis que andam por aí estendidos nas calçadas floridas de Brasília. Os olhos ardiam com a sensação de vazio que interrogava-lhe a natureza humana e egoísta; sentia-se um indigente. Desceu algumas quadras de onde havia deixado o carro, todo o comércio estava fechado, se quer um cigarro havia para consola-lo. Salvo por um canivete q trazia na carteira, conseguiu abrir o porta-malas do carro; entrou, estava exausto, deitou-se no banco de trás sentindo-se um daqueles outros, que maltrapilhos andam carregando sua trouxa pela rodoviária.Um saco de balas que havia comprado p a sobrinha estava embaixo do banco, estava salvo depois de umas doze balas sentiu o estômago parar de gritar. Lembrava-se dos filmes de Mackaver, seria tão heróico para o ego, fazer uma ligação direta e depois contar para todos os amigos o que havia feito, mas eram apenas nos filmes, se quer a mixa improvisada ligava o carro.
Não havia mais nenhum candidato saindo da escola, quase ninguém na rua, ouvira todos os cds q gostava quando o telefone tocou: - Consegui um chaveiro, mas vai demorar um pouco, são sessenta quilômetros até aqui!
Desistiu de sua irreverência que sempre costumava levar tudo na esportiva e foi obrigado, ao que nunca conseguia fazer sem tomar banho: cochilou no banco de trás, ouvia seus cachorros latirem, famintos, amarrados a tarde inteira, sentia o travesseiro e o cheiro de amaciante das cobertas.
Depois de duas horas as pessoas apareceram, o homem retirou uma mixa da maleta e depois de uns oito minutos, estavam ali, brindando a chave perdida, no boteco copo sujo, que àquela hora foi o restaurante mais chique da cidade e matou-lhe a fome c um pf requentado. Era gente novamente, depois das cinco horas indigentes.